Se tem uma coisa que eu admiro no meu pai é o humor. Contrariando todos os sintomas do Mal de Alzheimer, o humor dele tem sido sempre bom. No começo da doença era mais instável, teimava mais do que hoje, mas agora ele tem um ninho no riso.
Não sei o que acontece e se isso é obra divina, mas ele mesmo ri com o que pensa, sente ou sonha. E quando a gente faz alguma piada ele se diverte, igual criança que gargalha com nada.
Outra coisa que ele sempre amou e que agora está mais apegado – como ele diz – “os pequeninhos”. Da última vez que fiquei na casa dele nós tivemos uma festa de um dos filhos do meu primo. E quando ele foi dormir comentou que tinha sido um dia bom de muito passeio e que o que ele mais tinha gostado era de ver os pequeninhos. E emendou dizendo que quando eles crescerem mais ele vai poder brincar melhor.
Assim que ele terminou esta frase já brincou dizendo: ” – Você viu como eu gosto de criança? Eu gosto de você!” e deu risada. E no mesmo instante eu respondi: “- Viu como eu gosto de criança, eu gosto do senhor” e ele voltou a gargalhar…
É uma relação muito de mãe e filho. Hoje eu cuido, brigo e brinco como se ele fosse uma criança grande. Ele aprendeu a dizer que sente saudades. Fico feliz que ele ainda raciocine sobre as coisas. Ele acha que é importante ficar na minha casa porque eu não me casei e perdi minha cachorra e desta forma, ele faz companhia para mim.
Este pensamento, bem como outros que ele tem, para mim, são a prova de que somos pessoas com sorte. Seis anos diagnosticado e ele ainda processa as ideias de forma lógica. Ainda reconhece suas filhas. Lê o jornal, mesmo que seja 10 vezes a mesma notícia e se alguém conversar sobre atualidade, pode apostar…ele irá comentar suas impressões sobre política, futebol, Brasil e Mundo.
Mas eu herdei a preguiça dele. Isso não é bom. Vivo me cobrando uma postura mais ativa. Comparo com outras amigas que acordam às 5 da manhã para malhar e depois seguem seu dia e não param mais.
Enquanto isto, eu estou acordando e levo um tempo na cama para me levantar.
Costumo assistir vídeos sobre como deixar o cérebro ativo e a verdade que falho na missão em alguns momentos. Porém, a minha mente fica 24 horas do dia ruminando as coisas que aconteceram. Pensar é bom, em excesso é lixo sendo guardado nas gavetas do cérebro que deveria se ocupar de outras coisas.
Poderia ter herdado o bom humor também. Assim como afeto que ele aprendeu a demonstrar com o tempo e que ainda acho estranho vindo dele. Meu pai me ensina sempre, espero que eu esteja fazendo o mesmo com ele.
Ainda é difícil dizer em voz alta – eu te amo – mas já faço isso na escrita e mentalmente. Acho que esta construção de nós dois tem sido feita passo a passo. E com o tempo, acredito eu, teremos formado uma linda construção recheada de amor.