Ano: 2017. Local: uma loja de roupas. Cena: uma vendedora me convencendo a fazer um cartão da loja.
Senti uma certa urgência, quase um pedido de socorro dela. O cartão não tinha anuidade, muito menos bandeira, era apenas um cartão de loja que permitia que o pagamento ficasse para depois e na aquisição dele 10% de desconto.
Não sou fã de cartões, somente os estritamente necessários para situações emergenciais (coisas de criação dos meus pais: se não tem dinheiro para pagar agora, não compre!).
Já estava na fila para pagamento do presente e ela voltou para falar comigo: “moça, faz um cartão você não paga nada.” Eu perguntei:
– Você ganha alguma coisa se eu fizer?
” – Eu preciso bater a meta e até agora não fiz nenhum cartão.”
– Tudo bem, eu faço!
Ela me encaminhou para a mesa que seria feito o cadastro do cartão e começamos conversar…ela me achou parecida com sua irmã que mora na Itália. E começou a contar por todas as coisas que aconteceram em sua vida: aos 15 anos apanhou do marido por estar grávida. Parou na UTI e ficou internada por três meses. Veio para São Paulo fugida do cara que se a encontrasse com certeza faria coisa bem pior…Ela ainda tem sequelas por conta disto que aconteceu há 10 anos atrás. Tem desmaios e passa mal.
Ela continuou contando a sua história e eu pensando o quanto de coisa nesta vida a gente acha que tá passando e quando vê alguém com esta coragem descobre que somos nadica de nada…
Minha vontade era encontrar este sujeito e dizer que ele não faz ideia do que lhe espera, não porque eu irei fazer algo, mas porque a justiça é divina e chega para todos nós, mas a única coisa que eu fiz foi ouvir, acolher e aceitar um cadastro de cartão que no final acabou me rendendo um desconto de 10% da compra. Quem ganhou?
Ano: 2007. Local: uma tribo indígena. Cena: um homem branco da cidade batendo a cabeça de uma índia até ela ficar desacordada. Motivo: ciúmes.
Até quando vamos lamentar nossos dias difíceis porque não temos mais dinheiro na conta? Por que o nosso amor decidiu terminar tudo com a gente? Por que estamos trabalhando e queríamos estar de férias? Por que chegou o domingo à noite? Ou porque estamos em casa e queríamos estar numa festa?
Até quando vamos cegar nossos olhos para o próximo e esquecermos que o nosso umbigo é apenas um mísero pedaço deste Universo?
Tenho certeza que ela fez muito mais bem a mim do que eu a ela. Siga em paz!