Às vezes, tento pensar como uma criança: livre de pré-julgamentos ou pensamentos proibitórios. Resgatar a espontaneidade das crianças que convivi, porque eu, bem, eu não fui espontânea na minha infância. Não sei dizer a razão. Eu acredito que tenha sido porque desde nova me via na atitude de “servir”.
Minha mãe, por ser portadora de esclerose múltipla, sempre foi para mim alguém para cuidar. Ela não exigia isto de mim, muito menos reclamava, mas por alguma coisa que eu não consigo explicar aqui e agora eu me sentia responsável pelo bem estar dela. Era como um elo estabelecido sem palavras, apenas sentimentos.
Curiosamente terça e quarta, 26 (para católicos) e 27 de setembro (para Umbanda e Candomblé), são as datas em que se comemoram o dia de Cosme e Damião. Para quem não conhece a história deles, eram irmãos gêmeos, médicos que cuidavam de animais e pessoas sem cobrar nada. Foram acusados de feiticeiros, foram degolados por seguirem o mestre Jesus.
Criança tem algo que o idoso também tem: concessão para dizer o que pensa sem ser feio, errado, preconceituoso, maldoso, etc. Criança tem liberdade de ser ela. De dizer de imediato quando algo está errado. Emburra, faz birra, chora quando alguém a fere, perdoa depois de cinco minutos e esquece. Os idosos também. É que um está na ponta do começo e o outro na ponta do fim…deve ser por isto que se dão bem (pelo menos sempre vejo neles dois uma afinidade que não precisa de palavras).
Eu estou no meio do caminho: nem no início e nem no fim (de acordo com as estatísticas). E neste meio caminho sinto mais vontade de ser eu mesma. De chorar quando algo me machuca, de falar na hora (e não meses depois) quando alguém me desrespeita, de dizer te amo sem peso na consciência, de dizer que não quero ir para aquele colo! De comer o doce e depois o salgado, de me lambuzar na cobertura de chocolate. De pedir colo – o mesmo que rejeitei. De ter medo e pedir para segurar na mão de alguém.
Estou no meio do caminho e ninguém me faz voltar mais. O que já fui, adeus. O que serei, será.