Nasci duas vezes numa vida só. Primeiro, em 1984, quando meus pais me trouxeram ao mundo e me firmei como o caçula e, em 1994, quando eles decidiram por fim ao relacionamento que tinham. Nasci duas vezes porque a separação é um recomeço para o casal, mas também o nascimento de um novo olhar sobre a relação de toda a família.
Tinha 9 anos quando senti o peso da responsabilidade, mesmo que não me dada diretamente, de ver aquelas pessoas que eu amava bem. Me senti eleito a perseguir o tão desejado sonho de ver todos felizes e caminhei muito tempo em prol dessa busca. E é muito fácil encontrar personagens – da vida real e na ficção – com esse propósito, não?
Pense só: Dona Nenê, matriarca dos Silva, em “A Grande Família”, estava pela cozinha e, entre um afazer e outro, corria para salvar alguém. Ou é o filho, Tuco, ou o Agostinho, genro, o marido Lineu ou a Bebel, a filha.
Assim como no seriado brasileiro, o filme “JOY, o nome do sucesso”, a trama é marcada pelo tragicomédia de uma família, dessa vez ao estilo da classe média americana. E, assim como na versão tupiniquim, conta com uma matriarca. Diferente da Dona Nenê, Joy tem a pouca idade, que já denota características de uma outra geração. Em comum, a personalidade mais adaptada ao meio em que estão, refletindo a causa e o efeito das relações vivenciadas por elas.
A personagem do filme cresceu com pais separados e nunca desistiu de manter a família unida. Sua mãe é viciada em novelas e fica no quarto o tempo todo e o ex-marido e o pai disputam espaço no porão. A personagem ainda tem que lidar com uma meia-irmã invejosa que faz de tudo para que seus planos deem errado. Joy parece nunca dormir e vive correndo para que todos se sintam bem, mas não acerta o passo e vive cansada e cada vez mais longe de si própria.
No seriado e no filme, a família é o grande enredo para o desenrolar das histórias. Em alguns momentos o ponto central, em outros, o contexto. Quando Nenê e Joy apostam em si, nos seus sonhos, e acreditam que fazer algo em benefício próprio pode ser bom, elas ajudam à todos. Quando acreditam no seu potencial e lutam por ele, também dão um passo pelas pessoas que amam, mesmo quando elas acreditam que isso não está ajudando-as.
Se olharmos com calma para “A Grande Família” e “JOY”, veremos o quanto o comportamento das personagens tem relação com a constituição familiar. Bom, e isso não acontece só em filmes. Vejo comportamentos em mim que são facilmente identificados por conta de situações vividas no passado. O que faço é analisar o quanto aquilo me faz ou não bem, o quanto quero viver com isso. Identificar já é uma atitude e traz consciência.
Nenê, ao mudar o jeito de lidar com Tuco, viu o filho amadurecer. Antes de agir, ela precisou ver aquilo nela. Joy, que foi mais dura com o ex-marido e, mais tarde, com os demais, sentiu mudanças e pode, com isso, beneficiar todos. Ser mais assertivo e menos complacente fortaleceu laços e delimitou limites nas minhas relações familiares. Agimos muito em benefício próprio, por isso, é importante ver o que você ganha mudando também. É natural.
Com certeza, o enredo da minha vida seria diferente se algo no passado fosse alterado. Eu não mudaria nada, sou feliz assim. A Nenê e a Joy também.
Eduardo Alves, antes de ser relações públicas, sempre foi um observador. Agora, por meio das palavras, quer dividir suas reflexões sobre o que vê e sente do mundo.
#eduardoalves